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Um pouco frustrado com derrota em despedida do MMA, Minotouro admite: “Vou sentir falta de tudo”

Com 44 anos, o baiano Rogério “Minotouro” Nogueira deu adeus ao esporte que foi sua profissão por quase 20 anos. Mas a vida dedicada ao esporte de uma forma geral vem de muito tempo antes, ainda criança. Por isso, depois que enfrentou Maurício Shogun numa trilogia histórica e se despediu do MMA no último sábado, em Abu Dhabi, Minotouro admitiu que não será fácil viver sem ter adiante um próximo combate por fazer no cage.

– Vou sentir falta de tudo, é uma vida de dedicação. Faço isso desde 4 anos. (Sentirei falta) dessa questão de competição. Quando você tem competição, faz tudo para ela. Eu tinha um treinador que falava o seguinte: o que você está comendo, vendo, fazendo, a hora de dormir, isso vai te ajudar no dia da competição? Então, tudo que fazia era para o dia da competição. Não tinha luta marcada, mas sabia que marcariam. Quando você para, é como se tirasse o objetivo da sua vida, então agora é adequar esses objetivos para não ficar uma coisa vazia. Você cria um hábito tão grande com performance, com objetivo, que você dá uma descompensada em algumas coisas. O cara que é atleta profissional precisa estudar a inteligência emocional para saber lidar com as coisas quando você tira da sua frente o que moldou seus hábitos de uma vida. Essa é a situação que tenho agora, sensação de dever cumprido e agora é tentar focar em outros trabalhos. A carreira foi brilhante, tiveram coisas que não consegui fazer, mas também não posso ficar me lamentando. Agora é tocar para frente e pensar nas próximas gerações que a gente tem o poder de ajudar de alguma forma – afirmou, em conversa com o Combate.

Minotouro, já de volta ao Brasil depois do período na Ilha da Luta, contou que agora o foco vai ser ajudar os jovens atletas. A nova geração terá o apoio do agora ex-lutador, que comanda a equipe Team Nogueira junto com o irmão Rodrigo Minotauro. Mas um treino ou outro para “sair na porrada” ainda vai continuar acontecendo.

– Olha com é difícil: Hoje (uma quinta-feira), por exemplo, teve treino de muay thai, que gosto pra caramba, gosto de uma porrada (risos). Gosto de chegar lá e sair na porrada. Às vezes passa a semana toda e não faço todos os treinos, mas na quinta não falto! É dia de botar a luva na mão e ir para o sparring, gosto! Quando foi hoje, o Vander (Valverde, treinador) me ligou e eu disse que estava indo para a academia. Ele diz: “Pô Roge, dá uma semana para voltar a treinar”. E eu na minha cabeça: “Vou treinar para o quê se não tem luta mais?”. Ele sabe que sou viciado. Mas só ia lá conversar, não era para treinar! Quando o cara gosta, pode não ter luta, mas ele mantém pela própria saúde, para se manter ativo, e estar no meio do time e ajudar a garotada (…). Talvez o foco da minha melhor performance agora seja com foco na melhor performance deles. É o que está me motivando a voltar numa quinta e tentar ajuda-los. Mas é difícil se acostumar a não competir mais.

Ao ser perguntado se lamentava não ter tido a chance de fazer sua despedida do MMA num card do UFC no Brasil, onde estaria com a família e amigos, Rogério Minotouro preferiu olhar pelo lado positivo. E também puxou a orelha de muitos jovens mais preocupados em reclamar que aproveitar a chance.

– Vi nessa viagem agora, às vezes, o cara reclamando lá no restaurante: “Ainda bem que vou embora, 15 dias aqui, teste de Covid toda hora”. Eu falo: para quem não tinha nada, vindo aqui para Abu Dhabi, ganhando dinheiro, exercendo sua profissão, tem que olhar o lado bom da coisa. E eu com perigo de não fazer a despedida esse ano como queria. Não foi da forma como eu queria, mas o importante foi fazer. Isso foi um fato histórico no retorno do esporte, alguns eventos acabaram, outros estiveram perto, e o UFC foi lá e segurou, bateu recorde de PPV no meio de uma crise. Nós viajamos de primeira classe, avião fretado só para os lutadores, cada lutador e cada córner num quarto num hotel 5 estrelas. Me lembro que fui para Abu Dhabi em 2010 e no dia da luta do Anderson (Silva) fiquei nesse hotel, um hotel 5 estrelas. Na época tinha um patrocinador que botou a gente lá, e agora cada lutador num quarto. Lembrou muito a época do Japão, onde ficava em grandes hotéis com tratamento de artista principal do show. Queria que (a despedida) tivesse acontecido no Brasil, não foi na frente da torcida, mas foi em grande estilo na volta do esporte, dentro de um estúdio irado, tudo muito bem feito para que fosse uma noite especial.

Com o “modo empresário” já ativo há alguns anos, o lutador baiano de Vitória da Conquista acredita que a agenda ocupada o ajudará a se acostumar com a nova vida longe das lutas.

– Estou num ritmo de trabalho muito forte com as franquias da Team Nogueira, além de eventos e palestras. Isso tem sido uma coisa que me motiva também a trabalhar. Nos últimos anos tenho treinado, mas ontem, por exemplo, estava o dia todo de terno. Até tirei uma foto e coloquei no Instagram “modo empresário”, e às vezes era “modo atleta” só dois meses. Poderia ter treinado mais, mas agora é isso, focar nas outras coisas e talvez isso me distraia um pouco a não sentir tanto, mas vou sentir (…). Quando a gente estava indo embora (de Abu Dhabi), todos os lutadores no café da manhã, olhei e pensei: “Vou sentir falta disso”. Não vou conseguir sair fora dessa cachaça, é um vício (risos).

A despedida do MMA veio num duelo com lugar de destaque na história do esporte de combate. Pela terceira vez, Rogério Minotouro enfrentou o ex-campeão do Pride e do UFC Maurício Shogun. Pela terceira vez, o paranaense saiu com a vitória por pontos, dessa vez numa decisão dividida dos juízes. A sensação de Minotouro, apesar do dever cumprido após quase 20 anos de MMA, foi também de frustração pela derrota.

– Como já tinha programado 2020 para fazer minha última luta, e sabendo que foi a última, fica a sensação de ter que sair com vitória. Tive a luta na mão, com o nocaute muito perto. Ele bambeou algumas vezes, senti a luta muito boa para mim na distância, na velocidade em pé estava muito rápido, estava conectando os golpes mais contundentes. E aí no final talvez aquela queda possa ter sido o que na cabeça do juiz foi determinante para terem julgado aquele resultado. E fico naquela sensação de dever cumprido, fiz uma boal luta com 44 anos. Muita gente estava pronta para dar uma criticada, mas saí com dever cumprido (…). O pessoal fala que foi polêmico, mas ao mesmo tempo não quero polemizar e dizer que fui injustiçado, porque não foi uma luta ruim, o Shogun é um casca grossa, um guerreiro. A carreira foi ótima, tive vitórias e derrotas com os mais cascas grossas da minha categoria, desde Ryan Bader a Phil Davis, Tito Ortiz, Sakuraba, Rashad Evans…

Minotouro, ao analisar a luta round a round, viu a própria vitória nos dois primeiros rounds, o que foi diferente da maioria dos juízes. Dois deles viram vitória de Shogun em dois rounds, e apenas um deu triunfo para o lutador baiano.

– Quando estava dando uma sequência, pronto para nocautear, ele deu aquela queda no final, faltava 20s, acho que não contou. Aquele primeiro round foi meu com dois minutos em cima dele. Quando ele deu a queda, acabou o round. Pelas regras de hoje, você tem que dar a queda e ficar batendo mostrando superioridade. A superioridade que mostrei na trocação foi mais do que ele por cima. Acredito que o primeiro round foi meu. No segundo round tive mais domínio, entrei bem, aí depois a gente se bateu, ele caiu por baixo, fiquei fazendo ground and pound. O segundo round considero que ganhei. No terceiro, como tinha ganho os dois primeiros, comecei a andar para trás e administrar o resultado. Foi um round mais de administração, bati e saía, e foi no final do terceiro round que ele deu uma sequência e botou aquela queda, tentei dar uma inversão, só que caí errado e ele ficou por cima e terminou o terceiro round. Não foi assim “aquele ground and pound” efetivo. Na minha visão, ganhei o primeiro e o segundo, no terceiro realmente ele deu a queda, mas sem mostrar superioridade. Talvez era para ter ficado mais no meio e não perto da grade. Ele é bem forte, deu a queda na grade, quando ele cola na grade puxa na perna, tem isometria forte, ele lembra muito o Rodrigo, arrasta a perna na grade de qualquer jeito.

Com 33 lutas na carreira, somando 23 vitórias e dez derrotas desde a primeira luta profissional em agosto de 2001, no Japão, Minotouro destaca a importância que Shogun tem em sua história, sem nenhum rancor pelo fato de não tê-lo vencido.

– Desses caras que fico mais feliz de lutar é o Shogun. Quando casa a luta, sei que é bônus da noite ou lutão. Na primeira foi luta da década, na segunda foi a luta da noite, e o Sean (Shelby, matchmaker) falou que foi um lutão (nesta terceira), assim como toda a crítica. E o pessoal estava esperando uma luta ruim! Fiz uma luta boa ano retrasado com Sam Alvey, depois me machuquei e o pessoal estava meio assim… “essa luta vai ser do zumbi”. A gente provou que deu para fazer uma boa luta, que a gente está bem – concluiu.

Fonte: Globo esporte


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