Sou do tempo da fartura de peixes.Lembro-me dos incontáveis cardumes de peixes que subiam o rio Juruá, lutando contraa correnteza.
Eu ficava na beira do barranco, horas a fio, vendo as piracemas passarem: pacu, sardinha,
branquinha, pescada, peixe-cachorro, matrinxã, tambaqui, mapará; como era lindo veraquela natureza exuberante! De repente, eram peixes pulando para todos os lados, numa fuga frenética dos predadores — surubim, caparari, peixe-lenha, dourado, jaú e os botos (tucuxi e
vermelho) — no processo natural de sobrevivência.
Vi tudo isso na minha infância, nas barrancas do rio Juruá! Como dizia o poeta: “tempos que não voltam mais”.Sei que outros adolescentes como eu, que habitavam os rios Madeira, Purus, Jutaí, Javali, Içá e Negro, também se deleitavam com esse espetáculo da natureza pródiga — os
cardumes de peixes em arribadas!
Hoje, tudo mudou: a população cresceu; o homem descobriu petróleo; de uma matériaprima do petróleo fizeram as malhadeiras, motores, fábricas de gelo e enormes barcos
de pesca.
A pesca se tornou intensiva e predatória, e os cardumes de peixes estão cada vez menores. Pior, reagindo às agressões do ser humano, eventos extremos têm contribuído também
para a redução de peixes na natureza — secas extremas matam bilhões de peixes adultos
e os em crescimento, que são mais vulneráveis.
Embora reconheça que os nossos irmãos ribeirinhos — pescadores — precisam pescar
para o seu sustento e o de suas famílias, tenho absoluta certeza de que, se continuar
dessa forma, em menos tempo do que se imagina, não teremos peixes na natureza para
manter o sistema.
Quando assumi o governo do Amazonas, tive como primeira providência criar alternativas econômicas que viessem mudar essa situação, não só para os irmãos ribeirinhos, mas também para transformar o modelo de desenvolvimento do Estado, até então alavancado pela Zona Franca de Manaus.
Elaboramos, com a colaboração de especialistas multidisciplinares, da sociedade civil
organizada, de associações de classe, de ecologistas e de representantes do governo
federal, a MATRIZ ECONÔMICA AMBIENTAL. Com a participação efetiva da Assembleia
Legislativa, aprovamos o arcabouço jurídico (Lei 4.419, de 29.12.2016).
Agora, no governo Wilson Lima, foi acrescentada a Lei de Biodiversidade (Lei 7.303, de A Matriz Econômica Ambiental abriu um leque de oportunidades para explorar, de forma
sustentável, as enormes riquezas naturais (mineração, madeira manejada, piscicultura,
frutas tropicais).
A criação de peixes em cativeiro era um dos pilares da Matriz. O Amazonas tem as melhores condições para a piscicultura, seja em tanques escavados (usando as áreas já degradadas), em tanques-rede ou no leito dos igarapés.
Tanque escavado. Tanque rede. Criação sustentável de peixes em igarapés.
O projeto previa a instalação de uma grande fábrica de ração, utilizando o farelo de soja
da fábrica em Itacoatiara, pois o preço da ração era um gargalo; prévias articulações como BNDES, Basa, Banco do Brasil e os fundos internacionais e bancos de desenvolvimento
no exterior também foram realizadas para o financiamento.
A piscicultura seria desenvolvida em todo o Estado, desde que em áreas já desmatadas
ou em capoeiras, respeitando o adensamento florestal.Essa ideia não pode morrer; é urgente a sua implementação, porque mais de 700
milhões de pessoas passam fome no planeta Terra; no Brasil, são 8,4 milhões de
brasileiros que também passam fome.
Matéria publicada em: 24/07/2024.
A piscicultura permitiria a recomposição dos peixes na natureza, daria aos nossos irmãos
ribeirinhos uma alternativa para o sustento de suas famílias e proporcionaria ao Estado
do Amazonas uma nova atividade econômica.
Sonho com o dia em que o Brasil seja o campeão mundial de criação de peixes de água
doce em cativeiro e que o Amazonas seja o maior produtor do Brasil.
Manaus, 25 de janeiro de 2025.
Professor José Melo
Ex-Governador do Estado do Amazona
There is no ads to display, Please add some